30 setembro, 2006

4º Motivo da Rosa

Cecília Meireles

Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.

21 setembro, 2006

Presente

Juliana, feliz aniversário atrasado!
É bestinha, mas é de coração...

Se te chamarem “louca”, um certo dia
Disserem que tens ares de demente
Amor, não faça nada, apenas ria
Desse povo tão pouco inteligente

Pois loucos, sim, são eles, corja ingrata
Que nunca te compreendem nem te enxergam
A culpa é dessa estupidez inata
Que todas as tuas nêmesis carregam

No escuro vagarão eternamente
Bom gosto neles sempre foi ausente
Não sabem como é bom estar contigo

E eu sinto júbilo ante tua presença
Logo, anuncio com voz alta e intensa
O orgulho que me dá ser teu amigo


Rafael Souza Pinto

20 setembro, 2006

Neste mesmo domingo, do outro lado da cidade...

Wellington "CHE" Pessoa

Parado, olhava com angústia para o leito d’água que deslizava sob seus pés. Tentava estimular-se a enfrentar este momento que ele mesmo havia programado, o momento de sua morte!

Pensava este ser o melhor jeito de morrer, com hora marcada, sem a dor de deixar a vida e não querer deixá-la, sem sofrer o trauma de saber que se está morrendo contra a própria vontade.

Ele não, ele teria uma morte gloriosa, morreria quando bem entendesse e venceria a própria morte, ela não viria ao seu encontro, ele iria enfrentá-la...

Verificou pela milésima vez o nó da corda amarrada ao pedregulho, viu que outro nó da mesma corda em sua perna já o ferira e o sangue escorria como lágrimas que seus olhos negavam deixar aflorar.

Levantou-se, respirou fundo e...pulou! Já não havia mais volta, a água foi chegando mais perto e um calafrio percorreu todo o seu corpo, deixou-se sentir efulsivamente os últimos momentos de sua efêmera vida, o vento soprando em seu rosto, balançando seus cabelos, a adrenalina borbulhando em seu sangue, o frio da água enrijecendo seus músculos, seus pulmões pedindo ar.

Foi rapidamente ao fundo e lá ficou, parado, esperando a morte cumprir seu carrasco papel.
Pensou consigo mesmo: este é o momento mais feliz da minha vida!

Indiferente

Caixa e fósforo,
chama feita,
cigarro aceso,
marca impressa,
mão, dedos, boca,
lábios, aspiração.
Conteúdo sugado, queimado,
aproveitado, negado ou gozado.

Mas há cinza,
há a efermeridade da fumaça
que a ninguém agrada.
Embora logo seja dissipada,
esta não pode ser negada.

Você está gostando?
Alguém está gostando?
É indiferente.
Cinzeiro, chão.
É indiferente.

O que resta é o mesmo toco,
com a marca impressa,
de lado ou guardado,
mas com o tempo,
nada mais será lembrado.

É indiferente.

19 setembro, 2006

Irreversível

página rasgada
de uma agenda não usada,
dia com a vida
que não foi vivida,
memória esquecida,
alma resumida,
quimera limitada,
mágoa remoída,
alegria foragida,
lágrima reprimida,
o tempo tudo finda.

18 setembro, 2006

Latim é produtivo!

Eu estou cansada desse mundo chato!
Cansada de ser forte o tempo inteiro, de agüentar tanta dureza na vida para ter fragmentos de satisfação.
Estou precisando de uma grande dose de prazer e alegria para curar as feridas. Elas não doem mais, mas o tecido cicatrizado dificulta a caminhada.

Fico me culpando por querer "perder" mais tempo "útil" da vida, mas o meu Deus¹ disse: "Onde não há prazer, não há proveito."
Talvez seja exatamente esse o meu problema, pois ao acordar do meu torpor, quero proveito, quero gozar, quero gargalhar, quero me sentir viva.

Tão difícil! Qual o limite entre estar vivo e simplesmente existir?

Tempo perdido não se recupera, isso é fato e eu sei. Mas depois de tanto tempo adormecida, mesmo que num belo caixão, quero me sentir viva desesperadamente.

Isso é um perigo!!!!

Quero um tempo só pra mim. Tempo para buscar sensações, para não deixar a vida passar na tela novamente sem fazer parte do elenco. Sou a diretora, a roteirista, a atriz principal!

PORRA!!!!

Quero literatura: poema, conto, romance, vida.
Quero paladar: doce, salgado, ácido, vida.
Quero música: de ninar, de dançar, de pensar, de viver.
Quero me maltratar: cafeína, cigarro, álcool, vida.
Quero gozar: suspirar, gemer, gritar, viver.
Quero beleza: piercing, tatuagem, dor, sangue, vida.
Quero toque: no rosto, no cabelo, aonde vem a vida.
Quero Cecília, Augusto, Virgínia, William: vida.


¹: Shakespeare

17 setembro, 2006

Felicidade Realista

Mário Quintana

A princípio, bastaria ter saúde, dinheiro e amor, o que já é um pacote louvável,
mas nossos desejos são ainda mais complexos.
Não basta que a gente esteja sem febre:
queremos, além de saúde, ser magérrimos, sarados, irresistíveis.
Dinheiro? Não basta termos para pagar o aluguel, a comida e o cinema:
queremos a piscina olímpica e uma temporada num spa cinco estrelas.
E quanto ao amor? Ah, o amor...
não basta termos alguém com quem podemos conversar,
dividir uma pizza e fazer sexo de vez em quando.
Isso é pensar pequeno: queremos AMOR, todinho maiúsculo.
Queremos estar visceralmente apaixonados,
queremos ser surpreendidos por declarações e presentes inesperados,
queremos jantar à luz de velas de segunda a domingo,
queremos sexo selvagem e diário,
queremos ser felizes assim e não de outro jeito.
É o que dá ver tanta televisão.
Simplesmente esquecemos de tentar ser felizes de uma forma mais realista.
Ter um parceiro constante, pode ou não, ser sinônimo de felicidade.
Você pode ser feliz solteiro, feliz com uns romances ocasionais,
feliz com um parceiro, feliz sem nenhum.
Não existe amor minúsculo, principalmente quando se trata de amor-próprio.
Dinheiro é uma benção. Quem tem, precisa aproveitá-lo, gastá-lo, usufruí-lo.
Não perder tempo juntando, juntando, juntando.
Apenas o suficiente para se sentir seguro, mas não aprisionado.
E se a gente tem pouco, é com este pouco que vai tentar segurar a onda,
buscando coisas que saiam de graça,
como um pouco de humor, um pouco de fé e um pouco de criatividade.
Ser feliz de uma forma realista é fazer o possível e aceitar o improvável.
Fazer exercícios sem almejar passarelas,
trabalhar sem almejar o estrelato,
amar sem almejar o eterno.
Olhe para o relógio: hora de acordar.
É importante pensar-se ao extremo,
buscar lá dentro o que nos mobiliza, instiga e conduz
mas sem exigir-se desumanamente.
A vida não é um jogo
onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio.
Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade.
Se a meta está alta demais, reduza-a.
Se você não está de acordo com as regras, demita-se.
Invente seu próprio jogo.
Faça o que for necessário para ser feliz.
Mas não se esqueça que a felicidade é um sentimento simples,
você pode encontrá-la e deixá-la ir embora por não perceber sua simplicidade.
Ela transmite paz e não sentimentos fortes,
que nos atormenta e provoca inquietude no nosso coração.
Isso pode ser alegria, paixão, entusiasmo, mas não felicidade.